Com projetos integradores, centros universitários organizam novas formas de ensinar

Após um semestre de ensino remoto emergencial, o segundo semestre começou com perspectivas nada animadoras para o ensino superior privado. 

Olhando pelo prisma da gestão, a crise gerada pela pandemia aumentou os índices de inadimplência, evasão e pressão por descontos. Segundo o Semesp, a desistência deve aumentar de 30% para 40% até o fim de 2020. Já a captação de calouros pode cair 70%.

E ainda há os problemas de aprendizagem, já que muitos professores ainda insistem em virtualizar o ensino presencial. Será que estudantes e docentes da modalidade vão resistir a mais um semestre repetindo as mesmas dificuldades em relação à sobrecarga de trabalho e de atividades, além da sensação de um semestre perdido?

Com o aval do MEC para manter as atividades de forma remota também neste segundo semestre, através da portaria 544/2020, as IES podem se reorganizar de forma inovadora. Em vez de entregar uma carga elevada de conteúdos e atividades por disciplina, gestores, coordenadores e professores criaram projetos integradores – ou interdisciplinares.

Os projetos absorvem os componentes curriculares e aglutinam o que é importante e relevante para a aprendizagem do aluno, motivando-o a criar um protótipo ou algo concreto. Dessa forma, sob orientação do professor, os colegas interagem ao longo das aulas e encerram o semestre com algo que possam se orgulhar.

A ideia dos projetos integradores

Diretor do Grupo A Educação e especialista em metodologias ativas, Gustavo Hoffmann diz que hoje existe um abismo entre as competências definidas pela academia (e desenvolvidas pelos alunos ao longo de suas formações) e as reais demandas do mercado.

“A inclusão de projetos integradores no currículo de forma inteligente e a utilização de metodologias ativas de aprendizagem são elementos comprovadamente eficazes para reduzirmos esse abismo que só aumenta a ineficiência do nosso modelo educacional tradicional”, afirma.

Esses projetos integradores já estão no DNA de algumas instituições de ensino superior. Para entender como eles são praticados, conversei com gestores e reitores de diversas instituições.

Esta semana publicamos a entrevista com Raíza Brustolin, Coordenadora do Núcleo Integrado de Tecnologias e Gestão Educacional (Nite) no Centro Universitário Uniamérica, de Foz do Iguaçu (PR)

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Quais são os maiores desafios na oferta dos projetos integradores/interdisciplinares?

Diria que a aprendizagem por projetos, hoje, é uma das abordagens mais completas para o processo de ensino aprendizagem. Com ela, o aluno desenvolve habilidades técnicas e comportamentais, um senso de responsabilidade social, além da própria construção do conhecimento aplicado às suas experiências.

Nesse sentido, um dos desafios é promover a autonomia do aluno e um modo de pensar reflexivo e investigativo, que não precisa de respostas prontas (e rápidas) sempre, uma espécie de “desformatação” de um modelo educacional que prioriza respostas certas e a postura passiva e até obediente do aluno.

Em relação à matriz curricular tradicional, os projetos integradores e interdisciplinares consolidam parte dos objetivos previstos nas DCNs dos cursos. Os estudantes têm essa percepção na execução dos trabalhos?

Confesso que articular as DCNs aos projetos é algo que nem sempre é fácil, varia de curso para curso, porque corremos o risco de transformar o projeto em uma disciplina apenas com nome de projeto, mas que tem como objetivo contemplar certos conteúdos.

Acredito que tem um “caminho do meio” mas esse autoquestionamento constante é sempre necessário, tanto para quem elabora a matriz, quanto para quem conduz os projetos. Nem sempre o aluno percebe os conteúdos contemplados, depende do projeto, e da forma como o docente conduz.

Na Uniamérica temos projetos interdisciplinares, em que há uma tentativa de conciliar com as DCNs e fundamentos, e os projetos integradores que são demandas reais e não tem compromisso de contemplar nenhum conteúdo específico.

O aluno, por vezes, quer ver o nome da área ou do componente curricular e muitas vezes ele está diluído em diversas competências/projetos, que é o que ocorre com os cálculos nas engenharias, por exemplo, mas se o docente e o coordenador possuem visão de conjunto, é possível esclarecer o aluno com assertividade.

Quais foram as estratégias adotadas para manter os projetos em andamento em tempos de ensino remoto em massa?

Eu diria que o suporte técnico para as ferramentas, principalmente no início, e posteriormente o apoio “afetivo/emocional” foram os pontos fortes; a metodologia já estava estabelecida, o que reforçou e manteve todos juntos foi realmente o acolhimento e acompanhamento humanizado dos alunos por parte dos docentes, equipe de relacionamento e da própria reitoria em contato direto com os alunos por meio do conselho de líderes de turma.

Houve diferença em relação as turmas que atuaram em projetos integrados e as turmas que seguiram com as aulas remotas tradicionais?

Nós não temos turmas com aulas tradicionais, as etapas do projeto bem definidas e um cronograma organizado facilitaram o processo ativo do aluno na construção do projeto, mesmo com encontros virtuais.

Quais as orientações que vocês dariam para as IES que ainda não atuam com projetos integrados e querem implantar em 2020/2?

Eu diria que a relação com a comunidade e o relacionamento com empresas, instituições e órgãos públicos é fundamental, ter uma pessoa ou setor responsável por esse processo aproximando docentes e coordenadores dos parceiros facilita muito a realização de projetos que impactam a sociedade e aproximam o aluno da realidade profissional. Além da própria formação do docente com estratégias de acompanhamento e feedback do aluno.

 

Este artigo foi inicialmente publicado na página Desafios da Educação.

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